Idemar (Marinho do Nordeste) *
(Fragmento)
Mas vai um rio quase seco entre uma serra
Pequenina e outra grande que encerra
O mais sublime dentre os rios latinos…
A serra pequenina é a Serra da Laje
Que servia de trilha para os fugitivos
Sobreviventes do cerco e do ultraje
Dos capatazes ferozes e vingativos.
Preto cruzava o Jatobá penosamente
Levando seus pobres filhinhos nus aos ombros
Para enfim entrar no reino dos quilombos
Longe da morte dos senhores da corrente.
E a serra grande é a Serra da Barriga
Que por si mesma se supera em grandeza
É a serra mais imponente há quem o diga
Que lá de cima Zumbi via a correnteza.
E se sentia dos homens o mais feliz
E todo dia regava a liberdade
Até que um dia governantes por maldade
Subiram o monte com soldados e fuzis.
Quase que fui às varandas do Beberibe
Por lá também me requisitaram por luxo
Mas o meu coração interferiu: Arribe
Os costados, não menospreze o seu fluxo!
Vá para os agrestes em Caruaru
Reparar a vasa do coitado Ipojuca
Antes de ver os coqueirais da Jatiúca
Da serra de barriga veja o Mundaú!
O povo palmarino ainda hoje me chama
Recomenda que passando por União
Consagre o caboatã e a pindorama
Como símbolos vivos da abolição
Com que Zumbi em honra do sonho que tinha
Ergueu o primeiro reino da liberdade
E mais alto patrimônio da humanidade
Entre o rio Mundaú e a Laginha.
Invejo a sorte do pequeno Amanaú!
Que maltratado perseguido já aos tombos
Chegando fraco na terra do sururu
Glorificou-se quando cruzou os quilombos.
Molhando a folha do pau d’arco e da jurema
Folia e bálsamo do pequeno Zumbi,
Isso me deixa conformado ao subir
De volta quero reencontrar “Joacema!”
Bendigo aos teus córregos, Ó Mundaú!
Onde meu Brasil teve as vestes lavadas.
Desde Muquém até mesmo Onululu,
As lutas dos teus filhos são celebrizadas!
Vejo o mundo se achando em comunhão
Para de perto ver a face de Zumbi
E com ele acontecer de subir
O Monte e atingir a elevação!”
* Idemar Marinho de Barros (Marinho do Nordeste) – Músico e poeta palmarino, falecido em 2016, no Rio de Janeiro, onde residia. É irmão do jornalista e poeta Iremar Marinho