Um monstro flui nesse poema

Fotomontagem de Jorge de Lima - A Pintura em Pânico. Reprodução.

Jorge de Lima

 

Um monstro flui nesse poema

feito de úmido sal-gema.

 

A abóbada estreita mana

a loucura cotidiana.

 

Pra me salvar da loucura

como sal-gema. Eis a cura.

 

O ar imenso amadurece,

a água nasce, a pedra cresce.

 

Mas desde quando esse rio

corre no leito vazio?

 

Vede que arrasta cabeças,

frontes sumidas, espessas

 

E são minhas as medusas,

cabeças de estranhas musas.

 

Mas nem tristeza e alegria

cindem a noite, do dia.

 

Se vós não tendes sal-gema,

não entreis nesse poema.

 

 

(Invenção de Orfeu, Canto Quarto, Poema I)

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